O risco Trump
Grande parte da atual crise brasileira pode ser explicada pelos nossos equívocos. Cometemos falhas graves na condução da política econômica, o que nos causou explosão da dívida pública e elevou o risco de se investir no País. Porém, também devemos atribuir parte de nossos problemas ao cenário externo. Ele, que nos foi tão favorável há poucos anos – mesmo que por um relativamente curto período -, teve uma reversão, com o desaquecimento do comércio internacional e a desvalorização de nossas commodities.
Dessa forma, é necessário seguir observando, com atenção, os rumos da economia global, pois eles podem simplificar ou dificultar nosso processo de retomada do crescimento, afinal, somos, ainda, um País que depende muito de financiamento externo. Por enquanto, as condições internacionais estão nos ajudando.
Primeiramente, é cada vez menos provável que os EUA tenham recessão, muito menos superaquecimento. Ou seja, o crescimento apenas moderado dos EUA está controlando os riscos aos investimentos e evitando que o FED (o banco central americano) eleve os juros – o que faria com que investidores migrassem de economias emergentes, como a nossa, para os Estados Unidos. Por sua vez, a China, depois de sofrer alguns riscos com o mercado imobiliário, está experimentando uma estabilidade, que deve se prolongar até 2017, o que também favorece mercados como o Brasil.
Contudo, há preocupações. É muito provável que o FED aumente um pouco os juros já em dezembro, o que causará alguma depreciação no Real e em outras moedas latino-americanas. Há riscos também por causa dos diversos problemas políticos e econômicos na Europa, os quais podem causar piora no ambiente financeiro, e provocar desvalorização dos ativos de mercados emergentes. E, ainda, existe risco sério com as eleições presidenciais nos EUA. Nesta semana, várias bolsas e moedas caíram após a divulgação de pesquisa eleitoral em que o republicano Donald Trump apareceu, pela primeira vez, à frente da democrata Hilary Clinton.
As razões para que a eleição de Trump seja uma ameaça à economia global são diversas e, sobre isso, faremos algumas reflexões. As propostas anunciadas pelo republicano indicam estímulos ao modelo de crescimento que se baseia em abastecer o mercado interno com produtos americanos. Haveria fortes restrições às importações. Há, ainda, pretensões de investimentos em infraestrutura que poderiam elevar o PIB no curto prazo, mas que potencializariam a dívida pública, favorecendo o aumento dos juros. Todos esses pontos afetariam de forma negativa os mercados emergentes, e complicações comerciais com a China poderiam agravar ainda mais a situação do comércio internacional.
Assim, com Trump eleito, e acontecendo concomitantemente uma valorização do dólar e uma elevação dos juros nos EUA, teríamos, nos mercados emergentes, desvalorização cambial e pressão inflacionária, além de uma redução dos investimentos estrangeiros. Haveria, assim, pouco espaço para redução dos juros nesses países. Especificamente para o Brasil, portanto, seria um quadro indesejável, especialmente nesse momento em que é necessário conduzir um complexo ajuste fiscal.
Devemos considerar, entretanto, que a chance de Trump ser eleito é menor do que a de sua adversária e, mesmo que vença as eleições, suas medidas podem não ter o apoio no Congresso – as pesquisas indicam maioria democrata no Senado. De qualquer forma, o risco de medidas protecionistas americanas causando instabilidade econômica global, deve ser considerado por todos.
Confira as edições anteriores da Análise Econômica Semanal:
4/11 - Conter gastos públicos é necessário para a retomada econômica
21/10 - Por que os juros não caíram mais?
14/10 - Repatriação e investimentos: reforços no caixa
7/10 - PEC dos gastos e as reformas necessárias
30/09 - O Brasil e o ranking de competitividade econômica
23/09 - Avanços e riscos de um novo modelo de ensino médio
16/09 - O primeiro pacote de concessões
09/09 - O IDEB e os impactos na economia
19/08 - Dívida dos Estados e a necessidade de superar as ineficiências institucionais
05/08 - A queda da inflação e a revisão dos juros
29/07 - Déficit nas contas públicas: solução passa por investimentos e exportações
22/07 - Mudança na SELIC terá que vir acompanhada de medidas fiscais
15/07 - Precisamos aproveitar o cenário favorável
08/07 - Respeito às restrições do orçamento é imprescindível para alcançar meta fiscal
01/07 - O elemento central para a retomada da econonomia
24/06 - O "Brexit" como mais um desafio para a agenda internacional brasileira
17/06 - Sinais de confiança na retomada da economia
10/06 - Foco no cumprimento da meta de inflação
03/06 - No Caminho da austeridade
27/05 - Primeiras medidas evitam agravamento do quadro fiscal
20/05 - Controle das contas públicas e a eficiente gestão do gasto
13/05 - Competitividade, chave para retomada do crescimento
06/05 - A premissa da eficiência do gasto público
29/04 - O equilíbrio que se faz necessário nesse momento
22/04 - Os desafios do pós-Dilma
15/04 - Próximos dias darão o tom sobre as incertezas
08/04 - Um governo novo ou um "novo governo?
01/04 - FUTURO: Uma construção coletiva
24/03 - Não há saída sem a recuperação da confiança
18/03 - Destaques econômicos em segundo plano
11/03 - Os humores da política
04/03 - Efeitos da Lava Jato na economia
26/02 - Até que enfim, um sopro de positividade
19/02 - Programação Orçamentária e Financeira para 2016: cortes de gastos de R$ 24 bilhões